“Voilà! À vista, um humilde veterano vaudevilliano, apresentado vicariamente como ambos vítima e vilão pelas vicissitudes do Destino. Esta visagem, não mero verniz da vaidade, é ela vestígio da voz populi, agora vacante, vanescida, enquanto a voz vital da verossimilhança agora venera aquilo que uma vez vilificaram. Entretanto, esta valorosa visitação de uma antiga vexação, permanece vivificada, e há votado por vaporizar estes venais e virulentos verminados vanguardeiros vícios e favorecer a violentamente viciosa e voraciosa violação da volição. O único veredito é a vingança, uma vendeta, mantida votiva, não em vão, pelo valor e veracidade dos quais um dia deverão vindicar os vigilantes e os virtuosos. Verdadeiramente, esta vichyssoise de verbosidade vira mais verbose vis-a-vis uma introdução, então é minha boa honra conhecê-la e você pode me chamar de V.”
— Monólogo de V ao conhecer Evey.
O presente artigo se valerá de um instrumento de estudo muito comum na sociedade atual, utilizando recursos midiáticos e produções cinematográficas, como sendo um meio de abordar temáticas complexas e questionamentos político-filosóficos. Portanto, analisará um filme que foi inspirado por uma HQ, para refletir suas práticas, aplicando estas a um contexto mais recente, a partir de um prognóstico detalhado do mundo vigente, sendo assim, toda a ideologia contida ou semelhante, não fazem face à visão deste periódico ou afim, representando a conclusão obtida do escritor em questão.

Num primeiro momento, será feita uma síntese do filme, de modo a situar o leitor que pode não ter tido qualquer contato com a obra. Em Londres, num modelo distópico de sociedade que representa um futuro próximo, há uma jovem trabalhadora de nome Evey que conhece um defensor da liberdade carismático e misterioso de codinome V, onde o presente personagem busca vingança contra personalidades políticas que desfiguraram seu rosto, para tal, planeja um grande ataque ao Parlamento (prédio do Big Ben), acompanhado de uma brilhante revolução que dará outro rosto ao país, nesta trama, além dos demais personagens e figuras de importância, também se encontra um detetive que se atenta a determinadas práticas terroristas que tem ocorrido e busca o responsável por estas, de modo a evitar problemas futuros.

Com fins de contextualização histórica, ainda como algo contido e não explícito, está a Noite de Guy Fawkes, que só ocorreu por causa da “Conspiração da Pólvora”, estes eventos supracitados são conexos, sendo um o produto do outro e bem representam os primeiros ideais percebidos no filme. A Conspiração da Pólvora foi um plano criado por conspiradores em 1605, seu objetivo era explodir a Câmara dos Lordes, na ocasião da cerimônia de abertura do Parlamento que teria a presença do Rei Jaime VI da Escócia e I de Inglaterra, porém, não houve sucesso e na Noite de Guy Fawkes, quando um dos conspiradores que carrega o nome do evento – Guy Fawkes – tenta invadir o Parlamento e assassinar o rei, este é capturado, após torturado e esquartejado. A comparação com o filme se dá no ponto em que as situações são muito similares e o personagem V usa uma roupagem igual à de Fawkes, também quando faz memória do “aniversário” da noite, “pedem que nos lembremos de ideia e não do homem. Porque o homem pode falhar, ele pode ser apanhado, pode ser morto e esquecido. Mas 400 anos depois, uma ideia ainda pode mudar o mundo”.

(Prisão de Guy Fawkes)

Muitos grupos políticos interpretaram o filme como uma alegoria da opressão do governo, alguns Libertários usaram este como uma afirmação conservadora contra a intervenção governamental na vida do cidadão, já Anarquistas usaram o filme para propagar a ideologia socio-política do anarquismo. O filme também traz outra figura muito representativa que é o Alto Chanceler Adam Sutler que se mostra autoritário, totalitarista e deveras ditador. No fim das contas, sabe-se que o momento representa um pós-guerra mundial, quando, na verdade, o chanceler em questão é a figura real de um ditador em ascensão, com visão nazi-fascista, de nome Adolf Hitler que liderou a Alemanha, em sua atuação na Segunda Guerra Mundial, também in persona de um chanceler, não há qualquer discrepância entre os dois agentes.

Apesar de toda a materialidade já explanada, incluindo referências históricas, contextualização cinematográfica e parâmetros estabelecidos, o efeito principal ainda não foi abordado que é sua relação com a sociedade contemporânea. Pois bem, mediante tal ausência, somente trechos do filme já esclarecem a pauta: “Eu dedico esse concerto à senhora justiça que há muito tempo tirou férias desse país e em reconhecimento ao impostor que tomou o seu lugar”, “o artista usa a mentira para contar a verdade e os políticos, para encobrí-la”, “o povo não tem que temer seu governo, o governo é que tem que temer seu povo” e principalmente em “suas bombas não matam nossa fome, mas alimentam nossa desgraça”, esses e outros pontos são representativos de conexões, pontos tracejados em uma realidade que pode ser considerada alternativa, contudo, que é tão representativa de ideais da atualidade, onde, revela muito do que acontece e mais ainda a respeito do que deveria acontecer.


V de Vingança não é só política e a reflexão de uma sociedade totalmente desestruturada, corrupta, maldosa e gananciosa, tampouco, o espelho de uma ou outra ideologia grupal de seres específicos, como é com o Anarquismo ou o Libertarianismo, mas sim, um convite, uma exortação, um grito no fundo do poço por uma atitude mais sólida e concreta por parte da população. A sociedade está caótica em qualquer país, a fome e ausência de direitos básicos, sociais e individuais ainda é uma preocupação, como também o não reconhecimento de seres diferentes, sem contar a diplomacia sendo posta à prova, quebra do diálogo, censura da imprensa livre, a liberdade de expressão que não é tão liberta assim, o mal da corrupção que assola muitas nações e o eixo globalizacional que não promove o progresso, ao invés disso, reforça laços capitalistas cruéis, perante a fome mundial, tantas utopias que, apesar de todos os pesares, não são tão utópicas assim. “Igualdade, justiça e liberdade são mais que palavras; são perspectivas” e é assim que deve ser! Aceite o convite irrecusável à mudança drástica de uma plataforma governamental falida e corroída por tudo que há de ruim, através da democracia e dos direitos humanos empregados, aí sim, a mudança se dará de forma benéfica. É preciso ousadia e coragem para ser como V que se coloca contra o sistema e instiga pessoas à pensarem o quão bom seria o amanhã, sem as guerras ou ditaduras, com muita paz, esperança e confiança, também crença num amanhã igualitário e possível, sem qualquer apologia utópica, o personagem toma a iniciativa e reforça à todos os que temem a mudança e iniciativas como essas, mediante a repressão governamental sistêmica, “por trás desta máscara há mais do que carne e sangue; por trás desta máscara há uma ideia, e as ideias são à prova de bala”. Artigo escrito por Italo Medeiros, Revisado por Bruna Porto.