Na última quarta feira (26 de outubro), o Intercultural News teve a exclusividade de poder realizar uma entrevista com o renomado artista plástico, ativista social e embaixador da Boa Vontade da UNESCO, Vik Muniz. Aos 54 anos, o artista nascido em São Paulo, hoje vive e trabalha no Rio de Janeiro e em Nova Iorque. Suas obras são reconhecidas mundialmente pela criatividade na escolha de materiais, compostas de materiais sucateados e inusitados, como: restos de comida, resíduos de obras e até simplesmente... grãos de açúcar. Um exemplo bem famoso é o de seu quadro de Sigmund Freud , em que ele usa caqui estragado e calda de ameixa para reproduzir a figura do psicanalista.
No ano de 2010, o documentário “Lixo Extraordinário”, de João Jardim, retratou o trabalho social do artista plástico em Jardim Gramacho, bairro localizado no município de Duque de Caxias. O documentário foi premiado no Festival de Berlim em diversas categorias, destacado pela Anistia Internacional e o aclamado pelo público na mostra “Panorama”.
Esta entrevista foi realizada durante a oficina e fórum Efeito +, realizado na Biblioteca Parque Estadual. Realizado pela
ONG AFS, em parceria com a CISV-Rio, o evento reuniu 100 alunos de toda a região metropolitana do Rio de Janeiro para promover a aprendizagem intercultural e discutir sobre temas como cidades sustentáveis, cidadania global e o a importância das ações locais para a transformações de suas comunidades.
Para você quem é Vik Muniz?
- Acho difícil responder essa pergunta, principalmente para um jovem, porque quando somos jovens , nós buscamos ser pessoas baseadas em modelos existentes. Obviamente nós precisamos ter heróis, mas acho que mais do que isso temos que buscar ser nós mesmos, então diria... eu sou um projeto em andamento.
Como é ser embaixador da UNESCO e de que forma você fortalece esse grupo?
- A UNESCO sempre teve como principal trabalho, a manutenção e o desenvolvimento de valores dentro da sociedade, por exemplo: os lugares que são patrimônios da humanidade, esse endorso da UNESCO cria e trás a atenção da mídia e da população para os valores culturais existentes em determinados contextos. Fico muito feliz de ter sido convidado para ser embaixador, é uma honraria vitalícia não por um trabalho específico que realizei, mas por um conjunto de políticas pessoais que tenho feito ao longo dos anos envolvendo cultura, que é importante pois gera cunho social. De uma forma ambígua, não só trazer a conscientização dos problemas sociais, como também reverter idéias em capital, por conta da possibilidade me dada por ser um artista, todo o trabalho que eu faço que tem determinado cunho social e tem como meta gerar renda para esse contexto.
Como surgiu a paixão pela arte e como ela pode ajudar as pessoas?
- Quando criança, tinha problema para ler, era disléxico, então criei desenhos próprios como hieróglifos para ter melhor compreensão e acabou por se desenvolver até que quando tava na pré adolescência eu era o menino que desenhava na classe. Acabou por desenvolver um interesse meu do que é o mundo por outras representações, hoje em dia temos uma capacidade incrível de consumir imagens, estamos ficando cada vez mais descuidados de como compreendemos e discernimos o que é uma imagem. Acredito que meu trabalho tem uma obrigação ética de desenvolver situações em que a pessoa vê uma imagem e que ao mesmo tempo ela esteja pensando na maneira que a gente descreve e que a gente relata segundo nossas representações. Me envolvo como cidadão em projetos sócio-políticos, mas como artista eu tenho como responsabilidade desenvolver ferramentas para o entendimento e compreensão do mundo a nossa volta.
Qual o impacto que o evento Efeito+ pode dar a sociedade?
- Vim para o evento com o convite de premiar jovens que participaram do concurso de fotografia “Meu Mundo, Meu Rio”. Fotografar é algo que faço com frequência e quando me dizem coisas que envolvem jovens, cultura e projeto social, não precisa dizer muita coisa mais porque já me desperta o interesse.
Eu tenho 55 anos, é essencial me nutrir de energia criativa, muita gente que está na minha idade está se aposentando, se sentindo escasso, mas acho que se envolver com jovens é essencial! Estive esses anos todos como professor, faço como pai e acho até que essa paternidade dá a oportunidade de viver um mundo além do seu, como se você vivesse de novo a sua juventude, e eu agora com a Escola Vidigal que é um projeto meu pretendo dá continuidade a esse contexto. Acho até que a idéia da fonte da juventude tem a ver com a tentativa de entender o jovem de uma forma mais empática e menos crítica, as pessoas mais velhas tendem a pensar que gente jovem só faz besteira, como eu fiz também, porém acho que mais do que isso é ver que têm coisas incríveis que os jovens de hoje em dia podem fazer, o fato de você estar me entrevistando e dizer que vocês tiveram a iniciativa de fazer o jornal, já é a prova viva disso.
Todo projeto social que me envolvi, as pessoas agradecem por eu ter ido, mas a verdade é que me acho um amador. Cada vez que me envolvo com projetos sociais ligados à jovens, à outras classes sociais ou à culturas diferentes, a impressão que eu tenho é que estou sempre me enriquecendo e é um enriquecimento oblíquo. Quando fiz a
Escola Vidigal, gastei quase todo meu dinheiro do meu bolso então veio uma repórter que me perguntou “mas o que você espera com isso, qual será o seu retorno?” e eu disse “meu retorno é poder viver isso” e ela retrucou ainda.
A vida é um conjunto de experiências, e dever do cidadão maximizar esse conjunto, às vezes nós de uma forma geral não entendemos que a vida não se resume só em ganho capital, dar o seu tempo é importante, uma questão de dádiva e você sempre sai ganhando. O indivíduo que se fecha nas próprias convicções, elas tendem a viver num micro-mundo, é o que eu disse antes de premiar os indicados do concurso que, o sujeito vive através de extensões que ele mesmo constrói, então se ele vive na casa dele é do tamanho da casa dele, se ele vive no bairro dele é do tamanho do bairro dele, se vive dentro do próprio egoísmo, você é do tamanho do seu egoísmo; mas ao mesmo tempo que você procura conhecer novas culturas, como você citou sua escola bilíngue, você é do tamanho do mundo. Acredito que ninguém nasceu para ser pequeno e faço, como artista, passar a idéia de que ninguém é, e que as coisas são bem maiores do que elas aparentam e isso é algo que só nutre com confiança nos jovens, os jovens realmente acreditam nisso, só precisam de mais ferramentas para continuar acreditando.
Entrevista feita por Rafael Bahia
Revisão de Bruna Porto
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